Meu ensaio sobre amor'

Derluh Dantas
Quantas histórias de amor você já ouviu, onde em algum momento há: “você não lutou por mim o suficiente”? Nos romances há sempre alguém que precisa provar seu amor pelo outro, provar aquilo que sente e conquistar o ser amado. Estou enganado?
Por falas que ouço pelo mundo, parece que o amor é um tipo de troféu ao que sobreviver à guerra dos competidores. Desculpa. Mas, não gosto desse tipo de competição. Não acredito que amar seja um tipo de batalha, em que o vencedor tem por troféu o amor correspondido, pode ter tudo, menos o Amor.
Acho que amar é daqueles momentos espontâneos, que não sabemos explicar muito, não conseguimos entender os contrastes, mas não machuca, não dói e dura mais que a primeira ou trigésima tempestade. E ressalto que por tempestade digo as intempéries da vida, as adversidades do caminho e não o conflito chato de vaidades ou orgulhos entre os amantes.
Eu acredito no amor que se estabelece para além de regras estipuladas. Pode ser no primeiro olhar, pode ser no esbarrar de mãos e pode ser uma descoberta de tempos depois, que os amigos se percebem um tanto mais que irmãos.
Engraçado, eu tenho feridas profundas sobre a crença em amar, mas não é por sangrar, por doer, que eu não acredito no amor espontâneo, sincero, limpo. Entendo espontâneo como algo que acontece sem grandes planos, sem mirabolantes estratégias, sem concursos. Sincero, acho que é aquele momento do amor que se torna constante, que toda verdade pode ser dita sem machucar, pois a verdade é partilhada, é entendida, acolhida e se torna algo maior. Já o limpo é a falta de maquiagem, de teatro, de artifícios tantos.
Eu acredito no amor de mais de dois, mas acho que pra isso todos envolvidos precisam sentir amor comum. Mas, sou meio à moda tradicional, quero um amor de dois, que mesmo se tornando um, há espaço e encanto pela subjetividade, manias, peculiaridades individuais.
Não entendo o amor como violência, é justo oposto... Amar é libertar, deixar fluir e construir caminhos conjuntos. É como árvores que se encontram no amor ao vento, não violam a raiz, o caule, apenas partilham e incentivam as flores, promovem os frutos.
E por que isso agora? Encontrei um anjo, em forma de cão, ela me protegeu, me acompanhou, cuidou de mim dentre suas possibilidades e em nenhum momento houve cobrança, espontaneamente estávamos juntos. Partilhamos momentos até onde o caminho nos permitiu e mesmo sendo breve, naquele momento, tudo pareceu eterno, sincero, infinito.
Talvez, amar seja isso: se sentir livre e infinito na companhia agravável de outro ser. Lutem pelo amor de vocês, mas se for de lutar pelo outro, acho que isso não se parece muito com o que eu acredito ser amado e amar.
Há o amor unidirecional, mas se é realmente amor, quer dizer ser livre e infinito ao lado de alguém incondicionalmente, ainda que o outro não esteja comigo. E não pense que há uma vitimização nisso, falo daquele amor idealizado, que é segredo e tatuagem grande na alma, mas não machuca o amor futuro, o amor presente, o amor vivo.
Existem diferentes tipos de amor, mas nenhum deve ser forçado, conquistado por guerra ou luta, independe do amor, acho que ele deve ser de encontro, de magia, de fábula querida e singela, simples como a brisa que refresca.  E se for de lutar, que seja você e seu amor contra o que há de ruim no mundo.

Então, não há uma conclusão, uma fórmula. Aqui apenas expresso o que uma tarde de sexta provocou em mim. O que um cão, uma cadela, com seus dentes amostra, com sua lambida cúmplice, com seus passos companheiros, me fizeram pensar sobre esse meu desejo torto em amar. Não tenho desespero, nem pressa, apenas se algum dia for de acontecer, que seja sincero e bom amar, amor, ser.

Conversando com o Jão'

Derluh Dantas

Jão, e agora que me perdi de novo? E todas as teorias que aprendi naqueles livros, naquelas aulas, nos ensaios todos, Jão? Não valem de nada frente ao desejo ardente, à paixão. Jão, eu me lembro dos beijos roubados em avenidas, quebradas, esquinas... Beijos tão miúdos e sem sabor. Agora, o que me importa é o beijo não dado, o sabor mais aguardado, o desejo inacabado. Jão, como pode um coração tão ferido e magoado, guardado na caverna mais escura, profunda, se apaixonar de novo? Como pode, este descarado, desejar um abraço daquele sorriso tão lindo, navegar naquela forma tão encantadora em nariz, em covinha, em ondulações? Como pode, Jão? Esse sujeito que vos fala, não sabia o que dizer e quando ouviu aquele som, aquela voz... Aquelas palavras soltas e sem muito a dizer, quer tanto um tanto mais. Como você permitiu isso, Jão? Jorge, o São, não vai gostar quando voltar. Ele deixou você como guardião desse dragão de amar... E você baixou guarda e mais uma vez estou em sorriso, em poesia, encanto e paixão. Oh, Jão, pode não, Jão. – Tarde demais pra voltar, ainda é cedo pra amar, poetizar, mas como controlar esse dragão voador que é a inspiração, a paixão, hein Jão? Fala algo, Jão!

Na real'

Derluh Dantas
Eu já acreditei em muitas mentiras. Algumas das fantasias que me contaram, fizeram-me ser um tanto descrente e triste, mas não me sinto culpado. Não foi por culpa minha, que acreditei que pessoas podem começar sendo ruins, para depois se arrependerem ou se vangloriarem pela maldade cometida.
Quando eu era criança e brigava na escola, eu fazia de tudo para não levantar infâmias, difamações ou agredir fisicamente alguém. Reconheço que na hora da raiva, nos tornamos um tanto mais bestiais que de costume. Claro que revidei muitas vezes, algumas até provoquei feridas, mas não fiquei feliz com isso, nem um pouco que fosse. Eu já planejei vinganças, mas todas eram do tipo: “viu que eu não sou tão ruim quanto você queria me fazer acreditar?!” Em nenhuma delas eu pensei em tirar nada de alguém, ou ferir quem quer que fosse.
Por que digo isso? Ultimamente eu vejo as pessoas se agredindo como se isso fosse algo naturalmente bom, não é. Agressão, violência, brutalidade é algo que desvia o curso espontâneo das coisas. Por muito tempo e ainda hoje, ouço falarem que há amores que são aberrações, pecaminosos, errados. Eu ouço pessoas inteligentes dizerem que demonstração de afeto não pode ser explicada para as crianças... E logo penso, então as fantasias se tornam melhor se as crianças se tornarem assassinas, traidoras, mentirosas, esquizofrênicas em suas relações e crenças? Como você pode explicar ao seu filho que uma bola jogada entre vinte duas pessoas é mais importante que um abraço entre irmãos, ou um beijo entre dois homens, duas mulheres?
É um tanto arbitrário dizer que por causa de uma bola num campo verde as pessoas podem usar palavrões dos mais bizarros, agredir-se e tudo mais, não? Como você explica para uma criança que o amiguinho dela ou mesmo ela, pode ser agredido porque prefere o rosa ao invés do azul? Que forma de educação é essa que você julga boa para proteção de seu filho? Desculpa a sinceridade, mas essa sua lógica parece uma falácia daquelas mais bizarras, para mostrar que você não é tão inteligente, tão bom ou tão cristão assim... Você não parece estar preocupado com a dificuldade de ‘explicar’ ao seu filho sobre o amor, mas sim mostra a sua total intolerância e habilidade para o bizarro, o violento em dizer que é superior só por ser um machista procriador.
Não consigo entender, de forma lógica mesmo... Qual o sentido de dizer que o amor do outro é aberração, de impedir que o outro tenha direitos iguais aos que ‘você’ já tem. Não me cabe a compreensão de que suas escolhas, das mais fáceis as mais complexas, sejam boas pra todo mundo. Isso parece aquela birra na quinta série, onde você deseja pão com geleia, mas sua mãe só manda suco de limão e você tenta roubar seu coleguinha mostrando que ele é errado por ter uma mãe mais compreensível e um lanche melhor que o seu.
Não sou contra o futebol, não sou contra o heterossexualismo. Mas, acho chata essa mania de achar que se o vizinho é homossexual, seu filho vai ser também... E se for? Ele não vai se importar tanto com a violência fora de casa, ele vai se preocupar em não decepcionar você, pai e/ou mãe, que faz uma criança se sentir aberração ou monstro, sendo você que tem pensamentos tão bizarros sobre humanidade, civilização e ser cidadão. Troque sua proteção contra a realidade, em confiança, respeito, amor maior que os folhetins de palmadas, castigos, proibições ou falta de limites cabíveis.
Mas, não posso deixar de lembrar-me do que minha tia um dia me disse. Era uma tia emprestada, que mais valia que muito sujeito que anda pelo mundo se dizendo sábio. Ela me disse:
“- Um dia quero que meu filho tenha seus lábios e se pareça contigo ainda mais no jeito. [...] Não diga isso, você é um dos sujeitos mais lindos que conheço e você que pensa que a gente não sabe quem você é... E eu lhe aceito, lhe amo e lhe admiro exatamente por você ser como é.”


Com amor e sem fim.

Meu corpo em brasa'

Derluh Dantas

Havia muitas cinzas em volta dela, muitas palavras desnecessárias partidas no chão. Eram tantas nuvens escuras, que ela não queria mais vítimas, lágrimas, lamentos. Os homens ainda atiravam algumas acusações, defendiam algumas barbáries, mas ela estava em outra conexão. Foi ao chuveiro frio, que em contato com sua pele, neblinava todo ambiente. Ela queria dançar. Em cada toque de pele, uma pedra afiada era lançada, eram muitos adjetivos nocivos para um único ser. Mas, ela pegava cada palavra e separava as letras, fazia novo cordão de contas. Ela vestiu-se de deusa guerreira, mas não era pra guerrear, era para dançar vermelha em meio aquela caótica multidão. Bailou com raios, mas não os usou para assustar, só queria iluminar um tanto mais aquela escuridão branca. O que aconteceu com eles? O que eles estão defendendo? Eles já não sabiam, pensavam em alguma conspiração universal, política e lançavam acusações há quem tentasse som. Mas, a mulher de longos cabelos crespos, encaracolados, revoltos, estava de pés descalços e não queria briga. Cruzou-se com uma ventania e resolveu deixar pra ver onde iriam dar. E os homens, assim como muitas mulheres, corriam em círculos, defendiam contradições e tomavam partidos contra si, contra todos, contra o grupo. E ela sentia dor por ver seus filhos tortos, violentos, incoerentes. Mas, era mãe, era deusa, era anciã... Virgem de umbigueira desatada, de tornozeleira de latão, era rainha dos raios, era dona Iansã.

Tarde alterado'

Derluh Dantas
São tantos absurdos nos noticiários e manchetes de jornais que fico constrangido em falar de meu medo. Ainda assim. Esta tarde eu tive uma febre rápida e moleca, não foi pelo resfriado ou pela inflamação na garganta, foi uma febre pretensiosa, foram sintomas de saudade. Esta tarde eu pude ver a violência pelo mundo, na segurança cômoda do sofá da sala. Esta tarde eu senti muitas contradições e hipocrisias da nossa sociedade doente. Mas, o maior incômodo desta tarde, ainda me é a saudade. Saudade das conversas intermináveis na pracinha da cidade, dos passeios madrugueiros à beira do rio, das descobertas de insetos fantásticos... Fazíamos planos de casamento, emprego, família, negociações com a realidade. Era tempo em que eu chegava lá pelas madrugadas em casa. Saudades de alguns momentos em que não vivi e/ou da crença de algum sentido mágico e real para estar aqui, ainda vivo, nesse turbilhão de incoerências. Eu não sei ao certo – uma tosse de riso desesperado – o que eu poderia sentir hoje, além deste incômodo na garganta, da falta dolorida na alma. Estou com câimbras, estou abalado, é triste saber que o bem parece ser presente só com opressão e é triste saber que meu resfriado vai para além do físico. Esta tarde eu tenho medo, medo da minha vida e das mortes que se afiguram pelo mundo. Sei que é político, sei que é golpe, é interesse partidário, sei que é necessário, sei que é cabível, mas ainda assim sinto em saber que é aceitável e reiterado pelos sujeitos que andam pelo mundo. E me cabe esta dor de ser gente e esta dolorosa saudade de ser adulto inadaptado, inconsequente. 

[Minha] Religião'

Derluh Dantas

Há alguns anos que me perguntam sobre minha religião. – Ela me perguntou qual seria minha fé. Ele perguntou-me se eu era do candomblé. Outra senhora falou-me que eu deveria ser cristão e se eu já o aceitei em minha vida. – E de tanto ouvir essa dúvida, responderei aqui... Minha religião foi encontro, nos encontramos quando eu tinha oito anos de idade e até então estamos muito bem juntos. Não, não sou Cristão, mesmo frequentando a igreja, lendo aquele livro sagrado, a bíblia e ouvindo tudo que tinham pra dizer de Deus, do Diabo, de mim, eu nunca fui dessa religião que pregam por aí. Minha religião é de ‘religar’, é conexão, compaixão, amor, aceitação. Meu templo é o mundo, tão complexo e sincero, drástico e dramático como ele bem pode ser. Meus irmãos independem da crença, da cor de pele, da sexualidade, do pecado ou salvação. Minha liturgia é a atitude, a palavra, o encontro com cada ser que existe no mundo, real ou fantasiado. Meu ritual é liberdade, a mais pura natura de ser desejo, polêmica, proibição, contradição, reflexão. Meu livro sagrado é aqueles que narram vidas, que desenham poesias, que floreiam paixões. Não sou do candomblé, apesar de achar uma religião extremamente bela e encantadora pra mim. Meu paraíso e inferno se confundem com o aqui, o agora, o porvir e o antevir. Meu Deus é mulher, mãe, daquele sujeito superior a tudo e qualquer coisa... Minha divindade entende cada vitória e falha de sua criação e não escolhe partido para definir o que é certo ou errado, ama com adoração sua filha, filho, invenção. Minha religião tem um nome, tem um começo, tem um principio... Desde os oito anos de idade, ou mesmo antes disso, eu sou Wicca e assim me liberto de toda opressão que tentarem me imputar. Pois como bem sou da face da Deusa, eles podem me apedrejar, não me compreender, me queimar em fogueiras ou condenar-me à forca, mas minha alma é livre, como sempre foi, será e deve ser!

Por Elizabethtown'

Derluh Dantas
Sentidos. Daquelas lembranças alheias que se misturam com as nossas. E rimos o nosso riso, choramos as nossas lágrimas. Sentidos. A trilha sonora que se confunde com a que queremos pra gente. Fotografia sutil, um olhar intimista, a frustração no misto de drama e superação quase não percebida. A lágrima que não cai e o riso que aos poucos se desenha ainda mais sincero que a falta, o fracasso. É um filme do tipo só meu, com pipoca, sofá confortável, muitos travesseiros e poesias intimistas. Não sei que palavras me cabem, só me surge: Sentidos!
Da direção, parte técnica, enredo, interpretação, elenco, acho tudo milimetricamente bonito. Da trilha sonora, envolvente do tipo “viaja comigo”... E os diálogos, como é possível o clichê do romance, ser tão original e cabível assim? Horas no telefone, silêncio pessoalmente.
“Acorda e me pede pra ficar”...
“E você sempre terminando comigo, sem termos nada”.
“Somos os substitutos, lembra?” – “Eu quero mais que isso”, dizemos com o olhar!

Elizabethtown (2005), um filme produzido por Cameron Crowe, Tom Cruise e outros. Dirigido por Cameron Crowe, fotografia de John Tol e protagonizado por Orlando Bloom e Kirsten Dunst.

Mais um'

Derluh Dantas

José Wilker morreu. Não, não vou virar um super fã e traçar retalhos de sua biografia para falar de sua grandiosidade. Também não irei falar dos mistérios que me surgem ao ler sobre sua morte ou sobre a surpresa tamanha da mesma. Mas, essa notícia me veio um tanto inacreditável, por um tempo achei ser mais uma piada dessas que surgem pelas redes sociais e que falam de alguma baboseira qualquer. Porém, realmente foi uma morte, uma perda, uma tristeza. Lágrimas não me surgiram pela morte do Wilker, mas fiquei triste em saber da sincera liberdade da morte. Não sobre o ator que morreu, é sobre a morte. A morte não manda um anúncio avisando de sua chegada, ela não sinaliza a forma ou o momento que irá se fazer presente, ela simplesmente triunfa sem roteiro prévio. Muitos pensarão que para quem tem um “Deus” – que só serve aquele que mais parece um tirano – a morte nunca vencerá. Perdão, moribundos! A morte não tem disso... Morrer é simplesmente estar ausente para um abraço, para saciar uma saudade, para sorrir ou chorar mais um conto. E morrer me assusta, não a minha morte, mas a morte daqueles que quero perto ou daqueles que por algum insano sentido eu acho que teria perto se não fosse a morte. E assim, fico triste e me lembro da dor do revés... Simplesmente, eu não abracei quando a vontade surgiu, eu não liguei quando quis ouvir aquela voz, eu não tive um assunto para ter um tempo a mais... E se aquele olhar foi o último – tudo estranho, não sei mais o que dizer. A morte mexe comigo de uma forma estranha, não precisa ser alguém que sei o nome, mas sempre que alguém morre me parece um tropeço do universo. Quando morre, parece que uma luz se apaga no mundo e o vazio triunfa em parte sobre o tudo. Mais uma vez eu tive medo de perder e preferi o silêncio por não saber o que dizer. Só que eu “preciso”, eu quero mais um abraço seu! O primeiro ou mais um.

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