Sussurrando concreto

Derluh Dantas

Algo foi perdido. O tempo tem sido desculpa pra depois. O espaço tem sido desejo de saída, mas não se encontra caminho pra isso. Tudo tem se tornado insosso, sem tempero. Houve uma ousadia, o corpo foi pintado pelo desejo da alma, porém precisou ser travado, secreto, ocultado. Há uma conspiração para deixar de ser gente, deixar de ser carne, fome, mundo. Os passos são pesados, o sorriso mais estridente, mais raro. Nenhuma falta é maior que a ausência da paixão, do anseio. O que tem acontecido com a idade? Comigo? Não consigo mais conto, prosa, poesia... As palavras se formam e caem perdidas pelo jardim sem flor. Faz-se primavera, faz-se luar, mas minha alma se guarda e some repartida em fotografia, sono, silencioso clamor. Por que essas palavras? Uma tentativa dissociativa de retorno, saudades de Cristina, saudades da intimidade e do sentido sem pudor. De algum jeito sinto esperança, mas vejo-a adormecida, não consigo abrir seus olhos, ouvir seu canto, tudo neblina e distância. Por mais que eu pense ter encontrado meu autorretrato, menos nítido percebo a existência de minha imagem, daquilo que realmente sou ou desejo ser.

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