Madalena Puta Cristina '?'

Derluh Dantas
Ela parou em frente aquela multidão. Todos pareciam estar carregados de pedras para atirarem nela assim que abrisse a boca para se defender. Pelas circunstâncias do momento e da cena, preferiu ficar calada, esperar pelo bom senso de um Deus que ouviu falar quando era criança.
O que fizera para chegar até ali? Ela não sabia muito bem. Sempre foi uma mulher de boa índole e de dignidade. Envolveu-se com alguns homens, homens que depois descobria não serem bons o suficiente para o que desejava. Ela não queria um dono, nem alguém que a batesse por não ter esquentado o feijão na hora certa. Ela beijou algumas mulheres ao longo da vida, não se envergonhava por isso. Gostava de roupas decotadas, quando se julgava bem para usá-las e usava roupas ‘comportadas’ para trabalhar. No trabalho, reivindicava ganhar o mesmo que seu colega de cargo. Não costumava baixar à testa, quando se julgava certa. Julgava-se – ela achava que só quem a conhecia suficientemente bem podia se arriscar nessa área, mas julgamentos eram pra ser pessoais e não a determinação do que era permitido ou não aos demais – assim pensava. Sempre foi muito autêntica e sincera em seus pensamentos e suas atitudes. Sinceridade essa, que surgia de grandes reflexões sobre sua vida e a realidade que vivenciava, conhecia, lia em literaturas e jornais.
De tanto ser ela mesma, chegou até aquele ponto. Pelas roupas decotadas os homens a viam como “chocolate mordido” e disponível a qualquer um. As mulheres, pelos beijos dados a outras mulheres, a via como uma pervertida sexual. Por não se subjugar, ao que chamaremos aqui de machismo, ela era tida como uma desvairada de ideais. Chegou, então, a hora do ‘Julgamento Final’... Todos estavam prontos para atirarem suas pedras e aquela mulher em silêncio pensava no quão bom é ser quem realmente se é. Mesmo com todas as pedradas possíveis, ela tinha em mente o tranquilo gozo de sua liberdade e das consequências ‘reais’ de seus atos, julgassem o que julgassem.
Então, quando a primeira pedra em palavra saiu da boca de alguém da multidão. Ela agradeceu por ser chamada de PUTA. A segunda foi LOUCA, novo agradecimento. Outra foi SAPATÃO, ela se orgulhou novamente. E foram tantas outras lançadas, apesar de serem palavras distintas, ela só ouvia: COERENTE, CORAJOSA E LIVRE CRISTINA. E as pedras lançadas se tornavam pétalas em sua alma livre, vívida!

Um comentário:

Lane SoL disse...

Putis que lo pariu-lhe! Senti vontade de ser cristina! de tatuar cristina! você a escreveu tão viva, tão lúcida, tão gente, que meu desejo agora seria de poder tocá-la e sentir eu mesma, mais viva. Cristina parece que existe... - e quem ousa dizer que não? O significado mais amplo do nome Cristina é "ungida por Deus", ou mesmo "escolhida por Deus". Ou pela Deus@. Eu quero ser Cristina também.

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