O negro da quinta'

Derluh Dantas
Acordei ainda triste com os abandonos que se fizeram presentes... Mas, ao abrir os olhos ainda marejados, havia um sorriso inocente de menino, gritando e pedindo pra eu sair da cama. Era um menino barulhento, que me beijava, puxava meu cabelo e insistia que eu me levantasse. Era meu primo pequeno, filho de minha prima, amiga da época de criança. De ímpeto cantei algo antigo, que meu pai da escada completou. Depois de algumas horas de acordado, sou surpreendido por um pedido de conto, me prometeram uma inspiração... E foi assim que surgiram pinturas únicas, naturalistas, um Adônis de noite encarnado. Um corpo bem desenhado, traços marcantes e a pele negra como um chocolate puro, uma noite de lua nova, uma festa pagã, uma devoção em imagem. Durante a tarde, um canto forte vinha do pé de acerola, era um canto ímpar, solitário e rasante ao barulho urbano da rotina. Era um pássaro pequenino, todo apressadinho, mas de um canto inebriante. Sorriso de criança, corpo de deus afro, canto de passarinho... Não posso esquecer-me do sol poente e das pequeninas ervas escuras no muro sem reboco, pelas bandas do terreiro no fundo de casa, fazendo cócegas ao tocar de mãos. Há também um conto desenhado em tristeza, de uma beleza única, que mesmo não sendo foco, fala de nossas prisões e a oportunidade de escolher a liberdade. Em meio tudo isso de quinta, não sei ser feliz, tristeza bem me cabe, mas não posso deixar de revelar ao amigo:
Toda emoção é fugaz,
só vida é constante,
ainda quando em aparente falta.
Faltou o erotismo explicito, mas é de uma sinceridade autêntica este meu conto. Ao momento, isso é o que lhe ofereço como missão desejada e por este sujeito errante, digo que cumprida.

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