Derluh Dantas
Não é fácil, não é normal... Você não
imagina como machuca e sufoca. Não tem nada a ver com pecado divino, com
questões naturais ou o que mais você usa pra justificar. São péssimos os
olhares de reprovação ou curiosidade. Os rótulos que nos aproxima do aceitável
ou nos delega a categoria de bizarros, sociopatas, kamikazes da boa família. Extramente
violento essa mania de termos que assumir, termos que mudar, termos que nos
adaptar. Ainda há o discurso de que cada tapa e ofensa que recebemos, na
verdade fomos nós que procuramos, por sermos quem somos. Mas, não é bem assim...
Queremos andar de mãos dadas pelo parque e
isso não se tornar um assunto polêmico, o destino da humanidade. Queremos ter
belos casamentos, há quem queira no vale, na praia, em uma igreja que fora
batizado, e isso não ser assunto da semana inteira em algum folhetim cheio de
ofensas ao casal. Queremos no almoço de domingo toda a família reunida, os
amigos sorrindo e sem aquela bolha de estranheza quando estamos conversando
sozinhos em algum canto da casa ou apenas mais próximos que a dez metros de
distância. Queremos beijos na entrada ou saída do cinema, sem precisar que as
luzes se apaguem para segurarmos no dedo mindinho do outro, com o receio de
sermos descobertos e isso ofender alguém. Queremos ser quem somos e isso não dá
o direito a ninguém decidir para onde vamos, como devemos nos esconder, qual
mentira iremos contar dessa vez.
Não é fácil, não é normal... Você não
imagina como é difícil ter que viver em um mundo onde o meu amor é desculpa
para o erro alheio. Não é circunstancial ou natural que minha expressão de
carinho, que meu afeto, seja motivo para a violência, a ofensa, o conceito que
for. Machuca ter que ponderar palavras ao amigo, para não ser mal interpretado
por ele ou por terceiros. Ou termos que usar de muita energia para mostrar que
por amar diferente, não somos nenhum compulsivo sexual que a qualquer momento cometeremos
um crime de pedofilia, zoofilia ou assédio.
Quando vamos às ruas com nossas cores e
brilhos, é uma tentativa de mostrarmos que não somos tão monstruosos assim.
Quando buscamos por uma lei que nos proteja, não é por privilégios, é uma
tentativa de sermos protegido por algum lado, de algum jeito, para termos o mínimo
de segurança de não sermos assassinados por sermos assim. Estamos cansados de
chegar a casa com olho roxo e coração partido pelas coisas que ouvimos ou por
algum agressor que pensou em violência física para nos educar como ‘homem ou
mulher’. Estamos cansados de ao dizer com quem queremos passar o resto da vida,
ainda que isso não aconteça, sermos expulsos de casa, da escola, do emprego. Ou
estarmos no bar ou shopping, onde pagamos como todo mundo, ou na rua que é
mantida também pelos nossos impostos devidamente pagos, sermos convidados a
sair ou nos ‘conter’ por ter ofendido alguém da redondeza. E ao olharmos em
volta percebemos que muitos estão no colo, entre beijos ardentes e fomos
advertidos apenas pelas mãos dadas.
Não é natural quando você é de um jeito e o
resto do mundo diz que você é errado, é abjeto, é feio. Não queremos que as
pessoas gostem de quem somos, que assumam como somos, mas queremos respeito. Se
não gosta, se não aceita, ao menos deixa que cada um viva suas próprias
adversidades, sem precisar ter que vivê-las e ainda ter que lidar com a sua
violência só por não ser quem você imagina que deveríamos. Não é socialmente
aceito, ou não deveria, sermos expulsos de um transporte público, que pagamos
para entrar como qualquer outro, apenas por segurar na mão de quem se ama e ter
que ouvir das coisas mais vulgares já imaginadas entre aplausos para o ofensor.
Não queremos ser tema de sermões na igreja que dizem do quanto somos ruins e deus
nos odeia – esteja na escritura que for. Ninguém mais tem falado do direito de
propriedade de um homem sobre outro, está nas mesmas escrituras, não é mesmo?
Não é aceitável que o amor de uma pessoa, o
jeito que ela se veste, senta ou anda, o brilho que usa na roupa ou mesmo a falta
dele, que a presença ou falta do salto, nos torne monstros que podem ser ‘educados’
pelos ‘humanos de bem’. O amor alheio, não destrói a sua família. E outra coisa
nociva, é ter a ideia de que a expressão do amor dos pais, vai determinar a
sexualidade do filho... E se isso acontecer, qual o problema? O único problema
que vejo é a sua desnecessária expressão de preconceito. Quando eu penso em uma
criança, só penso no quanto espero que ela seja feliz, educada, saudável, amada...
Nada tem a ver com quem ela se deitará quando adulta. Só não quero que ela
sofra ao ouvir que os pais deixarão de amá-las por elas serem como são. Como
tantos de nós ouvimos.
Você não sabe, você não imagina como suas
piadas inocentes nos dilaceram por dentro. Não imagina como ‘apenas sua opinião’
nos derrota por mais de um ano. Temos os mesmos problemas que você, mas ainda
temos que lidar com muitos problemas que você nos impõe só pelo fato de ‘me
amar, mas não aceitar como sou’. O problema em questão, o que não é natural, o
que é amoral, nocivo é a sua falta de respeito com quem não é você.
Quando assumimos quem somos para o mundo, ou
saímos de um móvel qualquer, não estamos dando nossa cara à tapa, só estamos
vivendo aquilo que somos e isso não deveria se tornar a prioridade da sua vida,
da sua religião, da sua missão de tornar o mundo um lugar pior e mais violento
de se viver. Não quero o seu amor, eu exijo o seu respeito!