Derluh Dantas
Possivelmente, eu te amaria mesmo que
perdesse a forma que tens agora. Eu te amaria mesmo que você se esquecesse das
vírgulas ou confundisse nossa história. Eu te perdoaria por qualquer erro e
juntos riríamos de algumas lágrimas que porventura surgissem nas noites que ficássemos
longe. Eu me faria desejo à noite e durante o dia, seria uma companhia de
passos e sons.
- Será que você me amaria se meu cabelo caísse? Ou se eu ficasse
vulneravelmente “qualquer coisa”?
Acho que nosso amor superaria algumas
cicatrizes e seríamos cúmplices de alguns devaneios medonhos. O amor nos seria
aquele lugar que mesmo com as paredes em ruínas, não seria nem um pouco menos
bonito. Seríamos companhia, mesmo que as promessas fossem quebradas e a memória
se tornasse arena traiçoeira. Não importariam os títulos, escolaridade,
condição financeira, credo ou cor. Nosso amor seria um vômito de arco-íris e
uma dança de bolero, um samba, um tango, vermelho. Teríamos silêncio, haveria
distância, mas isso não afetaria nem um pouco o desejo, anseio, carinho. Eu te
amaria mesmo com as rugas, arrotos, pelos. Se houvesse remela nos olhos, não
haveria o constrangimento de limpá-los com a ponta delicada dos dedos. As
flatulências seriam nosso ritual secreto e cômico, como aquela velha competição
do odor mais intenso debaixo dos lençóis ou no café da manhã. E as guerras de
almofadas, comida, travesseiros... As caricias sob o chuveiro. Acho que nosso
amor suportaria até o momento senil de algumas ideologias e sonhos fracassados.
Perduraria a eternidade do espaço.
Teríamos segredos somente nossos e o
politicamente correto seria balela que a gente ouviu dizer. Nosso amor seria a
revolução mundial de nossos sorrisos e medos. Não seria perfeito, teríamos
brigas de deixar constrangidos os anjos e de fazer reconfigurar almas, tons,
melodias. Haveria algumas birras e picuinhas, brincadeiras. E sim, teríamos
ciúmes algumas vezes, mas eles seriam apenas o apimentado em alguma sobremesa. Teríamos
amigos distintos, compartilhados, do passado e que o relacionamento teceu.
Seriamos imperfeitamente nós – você, eu e os dois – enamorados e amantes
intensos. Em meio a tudo que pudesse ruir nossos sentimentos, nosso beijo seria
mais forte e invencível, ou mágico como aquele abraço nos festejos de dezembro.
Não pense que esse sentimento é
incondicional e pra sempre, há uma coisa que faria esse amor morrer, só um detalhe
pequeno e devastador como um vírus ruidoso e letal. Não é a traição, ou a
mentira descoberta, é algo mais funcional e silencioso. Nosso amor, só se
desfaz e morre com essa necessidade de não ser real. Se quiser ficar com
outros, pode falar que deseja variar o cardápio dos desejos e me permita,
obviamente, o mesmo. Para mim, amar é não necessitar inventar desculpas. Mas,
se tiver que mentir, se achar que algo precisa ser remodelado, dissimulado,
inventado para ocultar um fato, acho que o nosso amor já deu entrada na fila
dos desafortunados da vida, é um prenúncio inexorável de morte. Não precisa
desculpar-se, amar é liberdade e sei que os sentimentos podem mudar o tom, mas
o caráter não precisa depender disso. Nosso amor seria invencível, apenas se
nós dois tivéssemos assumido o papel fundamental dos sentimentos: a Honestidade
sobre aquilo que se sente, que não se evita, que se vive. Sendo assim, meu amor
morreu em meio às estórias mal contadas, não por elas, mas pela necessidade que
achamos que elas tinham de existir. Não pense que há menos amor agora, apenas
nosso desencontro com a sinceridade fez com que ele voasse por aí. Acho que a
morte é assim, um lugar onde habita saudades, mas não há como refazer os laços.
Admito, meu amor morreu, para algum dia, amarmos de verdade.
Um comentário:
Lindo amigo...
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