Há de convir, intimidade'

Derluh Dantas
Do alto do morro, imponente e inerte, a Igreja observa os profanos à beira do rio. Os profanos, com seus pés descalços, seus corações iluminados, dançam sem se importar com o julgamento que por ventura venha de que lado for. No olhar de um menino, um pensamento leviano se forma, ele quer casar, ter por um tempo infinito, um desconhecido que sorrir para outro alguém no largo. E no palco pouco distante, uma música se assemelha a sua trilha sonora. Aquela trilha sonora, o faz recordar das brincadeiras com os cágados e as aves do vizinho Juvenal. O menino insistia em chamar o velho de vô, só pelos cabelos brancos e a gentileza que o velho sustentava no olhar de molduras enrugadas e envelhecidas.
– Ele desejou escapar daquele abismo tão sedutor, do abismo que o fazia querer voar para a gaiola mais bonita já vista este tempo. –
Aquele momento que misturava a sinceridade do prazer e o misto de algumas belas crenças, o fazia delirar ainda mais com aquele olhar que ele buscava, como um sedento almeja o oásis de água mineral. Não pense que é um recorte de amor, um drama passional, ou algo assim. É direito seu pensar isso, uma limitação sua, admito. Há de se convir, que o amante não perde a admiração pelas falhas do encontro ou do objeto de afeição. Há de se convir que não existem regras para se admirar um sujeito qualquer. E que paixão, não é sujeita cativa para seguir os acordos ou protocolos estipulados. Sei que parece um retalho, um retalho de chita, com bainha em algodão-doce, em cores de libertar alma que se perdeu em um beijo que ainda se deseja.
– Licença, Poesia, eu não sei mais como usá-la... Meus sentidos ficaram lascivos demais para as palavras bonitas alcançar e as palavras feias iriam estragar a beleza pulsada por esse desejo de olhar. –
Que vontade de dançar mais uma vez, foram dois minutos? Três segundos? Não sei se o tempo parou naquele primeiro bailar, mas o infinito de sentidos ainda faz arrepiar a carne trêmula, de forma intimamente particular. E não pense na cadência, na lógica compartilhada... Há sentidos únicos em encontros de se amar. Ainda que seja um amor só de ilusão leviana, uma brincadeira sincera de um menino que permitiu não se preservar. A dança continua sendo a mais bela expressão do profano à beira de um rio, que tem de testemunha uma algoz pouco eficaz, acima do morro a observar!


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