Nazaré - Bahia, 28 de maio de 2017.
Derluh Dantas
A casa está significativamente
mais triste e vazia. Ao abrir a porta não terá mais aquela festa, os latidos,
arranhões. Não terei mais com quem deitar no chão e receber as lambidas e
mordidas suaves... Não tenho mais motivos para abrir a porta mais de cinco
vezes durante a noite e ficar chamando para entrar ou para não comer a “descoberta”
no cantinho do passeio.
Pois é, já não terei aqueles
olhinhos redondos e cúmplices a me acompanhar quando vou à cozinha ou ao
banheiro, quem arranhará minha porta pedindo para entrar ou para avisar que
precisa ir lá fora cheirar o mundo?
Não tenho mais em quem tropeçar
pela manhã cedinho ou quem me perturbar enquanto estou deitado no sofá, com aquele
focinho úmido e geladinho que me assustava quando eu cochilava no meio da
tarde.
Ele latia pra pedir biscoito, pra
dizer que havia alguém na porta, porque uma barata/besouro passou voando ou por
algum motivo secreto, e só parava quando a atenção estava por completo nele.
Quando mais novo, adorava um
carinho na barriga, depois se limitava a querer apenas um cafuné. Quando sentia
cócegas, se assustava com o espasmo nas patas traseiras. Era um dengo único
aquele serzinho preto, que não conseguiu sustentar a cor, era quase desbotado,
com toques intensos de um cinza empoeirado.
Caso eu tivesse que representar
um anjo amoroso e fiel, com certeza ele estaria na lista e colocação número um.
Eu costumava dizer que ele era um irmão canino de alma felina... Acho que as
brigas com os gatos fez ele se assemelhar mais com os felinos que com os cães
que via por aí. Era temperamental de um jeito fofo e especial, adorava rosnar
pra mim, dizendo que não queria carinho agora, depois se arrependia sozinho e
vinha cabisbaixo pedir carinho. Odiava ficar em casa sozinho, mas não se
interessava muito com a casa cheia. Ah! Preferia garrafinha pet a brinquedo de
morder, era um desafio tirar a tampa enroscada e fazer aquele barulho de
plástico sendo amassado, mas depois da tampa saída, o encanto se perdia e ele
deitava na escada olhando pra gente, como quem dissesse que cansou e precisaria
de uns segundos para o próximo desafio.
Nunca foi muito bom em devolver a
bolinha que a gente jogava, mas insistia para que jogássemos longe... Perdemos
várias nessa brincadeira. Apaixonou-se uma vez, sofreu meses por um amor não
correspondido, emagreceu, mas depois de um tempo melhorou com a ajuda de um
passeio na praia (adorava a brisa marinha). Sabia muito bem a quem pedir pra ir
à rua, pra banho, pra o almoço ou o lanchinho da noite. Quando estava triste ou
pra mostrar descontentamento, fazia greve de fome, mas não resistia a um
bolinho – de frango ou de ovos, adorava.
A gente já havia percebido o
avanço da idade, passamos por uns sustos antes, ele ficara doente algumas vezes
com a chegada da velhice... Mas, ninguém está de fato preparado para a
despedida. Sabemos bem pouco sobre a morte, apenas que ela é implacável e
inevitável, no dia da sua chegada, não há oração ou fé que sustente. Não
importa muito o amor que inspirou ou semeou, a morte não distingue nada
disso... Mas, as saudades e a falta sim, nós não falamos muito sobre isso, não
conseguimos elaborar direito o acontecido, não há como evitar o choro, o
pranto, a tristeza... Ele deixou um vazio que nunca será preenchido, apenas
aprenderemos com o tempo a lidar com isto.
E se alguém me perguntar o que
ficou de tudo isso?! Eu diria apenas gratidão, agradecimentos por ter a
oportunidade de conhecer, conviver, amar e ser amado por um sujeito, um
cãozinho feito de temperamento e muito, grande, sincero amor... De fato
conseguimos um nome que dizia de sua companhia FATE – em português é sorte,
destino – era nosso presente de seres míticos e da própria maravilha da vida.
Eu sinto saudades e continuarei a
te amar, meu maninho canino de alma felina, FATE – Descanse em paz.
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