Derluh Dantas
Dagô.
Estou em minha rua, caminhando para casa... E aqui vou traçar uns
contos que vejo. Dois gatos mestiços e malhados brigam por algo que encontraram
no lixo – sobrevivência e partilha. O menino de oito anos corre para algum
lugar que não faz parte de seu destino, a mãe o grita lá de trás – raízes e
destino. Duas senhoras sentadas na esquina, parecem falar de amores alheios ou
algo sobre alguma intriga – do passado e do abrigo. A criança sonolenta, na
porta de casa, luta contra o sono no colo de sua vizinha – carinho. Um grupo de
homens, com olhares e expressões, parece discorrer sobre fofocas e vidas
distintas – quebra de paradigmas. Os garotos, um de doze e outro de treze anos,
trocam olhares do portão, parecem descobrirem e tecerem o amor, há um canto e
alguns sorrisos – amor proibido. Uma senhora de oitenta anos tenta abrir a
porta de sua casa e se choca com a travesti que passa do outro lado e comenta
que ficou viva para ver homem de peito grande – surpresas do ser e existir. E
tudo parece alheio ao mundo, tudo parece atípico no meu bairro de criança. Falo
de onde sempre morei, o Batatan. E há o grupo da Igreja que canta em Louvor a
Santa Bárbara. Há uma explosão na padaria do lado de casa. A vizinha
protestante, que diz estar salva por simplesmente “ser” da igreja e proclama
protesto contra todos os outros, entre xingamentos e graves acusações. Faz-se
engraçado esse lugar no mundo, enquanto de fora tudo parece sério e sisudo, em
meu bairro a vida se faz rotina entre regras, exceção e abstração. Aqui a
loucura é cultural, a religião é multipartilhada, as mulheres jogam biriba e os
homens ficam de porta em porta na fofoca. E hoje a lua ficou mais bonita da
janela de casa, não há novos amores pela varanda, mas a lua fez sua homenagem
mágica à Bárbara, Iansã, Oyá. Se o mundo te parecer pesado e indecente, entenda
que há um lugar que a mulher de vermelho abre olhos, lança raios, forja metais
e não deixa a esperança ou a vida se dissipar. Feliz de quem tem um espaço para
sentir e sonhar.
Yá Eivikei.
Epahey Oyá!
Rogai por nós,
Oh! Bárbara!
Salve, Iansã!
Axé!
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